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Zabell Resende

Arte e vida social: uma representação da família

Atualizado: 15 de set. de 2021

FAMÍLIA no dicionário:

  1. Grupo de pessoas que compartilham os mesmos antepassados; linhagem, geração.

  2. Grupo de indivíduos ligados por hábitos, costumes, comportamentos ou interesses oriundos de um mesmo local.


O que podemos entender como família na vida social como um todo e não apenas como aquilo que nos é imposto?


Primeiramente, gostaria de esclarecer que utilizarei a família nessa parte do meu texto como um grupo de indivíduos ligados por hábitos, assim como citado na segunda definição dada pelo dicionário. Mas, o porquê dessa escolha?


Porque, aqui, deixarei um pouco do meu olhar e meu entendimento sobre a família. Sendo assim, interpreto essa relação como algo que foge do institucional, ou seja, acredito na família para além dos laços sanguíneos[1], das leis que o Estado impõe para definir o que é e o que não é família. Logo, a família envolve laços construídos ao longo do tempo e que envolve uma história de respeito, confiança, trocas, cuidado, responsabilidade e que compõem um ambiente de apoio. No entanto, ao longo do texto irei expor não só o meu ver, mas, também, o de artistas e como eles representam e entendem o que é essa união complexa e cheia de interpretações.


Cinema:

  • Como Nossos Pais:

Nesse longa, a diretora Laís Bodanzky resgata a realidade do ambiente e dos tipos de pessoas que encontramos no cotidiano familiar. Desse modo nos deparamos com Rosa, a protagonista, que enfrenta um drama pessoal: ela deixou de cuidar de si mesma para não falhar com os outros, uma mulher como qualquer outra. Portanto, mesmo que seja pessoal para a personagem, aqui temos uma questão que envolve papel de gênero[2], um conflito universal que mulheres sofrem dentro do ambiente familiar patriarcal[3].


O início desse drama começa quando Clarice, mãe de Rosa, faz uma grande revelação no almoço de domingo em família. A partir daí, Rosa se depara com grandes conflitos, como a ausência do marido, as tarefas domésticas, cuidados com as duas filhas e a pressão que as duas gerações (seus pais e suas filhas) fazem para que ela seja uma mulher engajada, moderna e onipresente.


O enredo é tão atual que fica quase impossível não se colocar no lugar dos personagens, daí cria-se uma aproximação personagem-espectador que chega a causar incômodos e reflexões em quem assiste. Temas como a identidade, feminismo, amor livre, estrutura familiar patriarcal [4], relação entre pais e filhos e a mortalidade são discutidos nesse drama, deixando as soluções como algo intrínseco ao autoconhecimento.



Podcast

  • Calma, Gente Horrível

Nesse podcast idealizado por quatro mulheres, Ana Roxo, Malu Rodrigues, Rita Alves e Tati Fadel, há uma discussão sobre família, suas dinâmicas, hierarquias patriarcais, heteronormatividade[5] e outras possibilidades de enxergar família para além desses laços de sangue, poder econômico, cristão e ditado pelo Estado. A discussão é feita de maneira dinâmica e até simula uma conversa de bar, sendo, então, acessível e até mesmo gostoso de se escutar, tendo um caráter de se estar entre risadas e reflexões.


Literatura:

  • O Pássaro Secreto

"O pássaro secreto é um drama familiar, no qual a protagonista, sentindo-se só, por ser diferente de seus familiares e amigos, se embrenha em um mundo de fantasias, onde os livros têm papel fundamental", definiu a própria autora.


O livro conta a história de Aglaia Negromonte, cuja vida foi revirada após a chegada de Thaile, sua meio-irmã que o pai havia escondido da família. O enredo segue uma narrativa de vingança, ciúme e sentimento de rejeição de Aglaia, por ter a atenção de todos voltada à nova integrante da família, que, por sinal, aparenta ser exaltada por todos. Assim como na realidade, a ficção contém emblemas familiares muito presentes no cotidiano das famílias, por exemplo, um pai que mergulha cegamente em sua profissão e deixa a família de escanteio, uma mãe sobrecarregada com as tarefas domésticas e a criação dos filhos.


Além disso, o livro aborda o tema sobre saúde mental e doenças como a depressão, ansiedade, crises de pânico e a ausência e compreensão e apoio dos demais personagens para com a protagonista, que sofre dessas doenças e transtornos. De certo é um livro que traz à tona tanto a questão do ambiente familiar com suas problemáticas e contradições, quanto aquela acerca do debate sobre saúde mental. Aproveitando que estamos no mês do Setembro Amarelo, campanha brasileira de prevenção ao suicídio, o livro carrega o ponto de vista de quem sofre essas condições psicológicas.


  • Campo Geral - Guimarães Rosa

“Miguilim não tinha vontade de crescer, de ser pessoa grande, a conversa das pessoas grandes era sempre as mesmas coisas secas, com aquela necessidade de ser brutas, coisas assustadas.”


Campo Geral é uma novela[6] escrita por Guimarães Rosa em 1964. A obra retrata a história de Miguilim e sua família, ambos nascidos no sertão mineiro e com evidentes conflitos causados pelas dificuldades da vida no campo. No entanto, a genialidade dessa novela está no privilégio de se captar a essência da vida no sertão através do olhar de Miguilim, que está vivenciando o tempo das descobertas, a infância.


Nesta narrativa, a família do sertão mineiro é ampliada de modo a tornar as situações corriqueiras um redemoinho de sensações ao leitor. Assim, é possível ter contato com o sincretismo religioso (mistura de diversas religiões, criando assim novos ritos religiosos), conflito familiar, cultivo de amizade entre Miguilim e Dito, seu irmão mais novo, a dura vida no sertão e a necessidade incontrolável de encarar os desafios que a condição humana apresenta, todos elementos centrais na narrativa. Dessa forma, as sensações do ambiente dessa família sertaneja serão compreendidas a partir dos sentimentos de uma criança, o que torna essa novela sensível com as impressões e conclusões que Miguilim capta.


Pintura:

  • Família - Tarsila do Amaral

“A Família. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2021.”


Nesse quadro, pintado em 1925, a artista modernista brasileira Tarsila do Amaral propõe representar uma família da zona rural com alguns objetos e animais. Diferente da primeira fase da artista, mais voltada a representar elementos naturais para captar um olhar mais nacionalista, aqui vemos uma pintura socialmente engajada e com um olhar mais crítico para os cenários da vida dos brasileiros.


Por isso, nessa obra, uma família é retratada de maneira um pouco mais melancólica - veja pela expressão facial e desfiguração dos indivíduos -, que simboliza a questão do abandono social das classes sociais trabalhadoras do interior do país e que vivem no campo. Os membros extremos, como pés e mãos, apresentam dimensões mais agigantadas justamente para trazer ênfase ao trabalho manual e de força a que essa família está condicionada. Aqui, também, apresenta-se a necessidade de se ter um núcleo familiar grande para se ter maior mão de obra, pois vemos que, neste contexto, a família está intrinsecamente ligada à ideia de venda de sua mão de obra para fins de sobrevivência no ambiente rural.



[1] Laços sanguíneos: que possui a mesma ancestralidade.

[2] Papel de gênero: dentro das ciências sociais, o papel de gênero associa-se aos comportamentos ligados à masculinidade e à feminilidade.

[3] Ambiente familiar patriarcal: refere-se aos papéis de gênero dentro da família. Exemplo: mulheres devem ser mães, donas de casa e responsáveis pela criação dos filhos

[4] Estrutura familiar patriarcal: família em que a autoridade e os direitos sobre os bens e as pessoas concentram-se nas mãos do homem mais velho.

[5] Heteronormatividade: termo utilizado para descrever situações nas quais as orientações sexuais diferentes da heterossexual são marginalizadas.

[6] Novela: é um gênero literário que consiste em uma narrativa breve estando, portanto, entre o conto (de menor extensão) e o romance (de maior extensão).



Referências Bibliográficas:



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