Recentemente nos deparamos com a notícia de que a Receita Federal, em um documento chamado de “Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS)”, defendeu a ideia de que tributos sejam cobrados na venda de livros utilizando o seguinte argumento: “De acordo com dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2019, famílias com renda de até dois salários mínimos não consomem livros não-didáticos e a maior parte desses livros é consumida pelas famílias com renda superior a dez salários mínimos”. Em outras palavras, a proposta é que preços mais altos sejam cobrados em cima de todos os livros sob justificativa de que pessoas pobres não leem e, portanto, essa cobrança seria justa e bem empregada na medida em que pessoas de classe média/alta pagariam mais caro e os valores arrecadados seriam revertidos em políticas “mais direcionadas”.
Cabe destacar que o Artigo 150 da Constituição Federal de 1988 garante a imunidade tributária, ou seja, a ausência de cobrança de impostos, em cima de: “[...] livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão” (BRASIL, 1988). Frente a uma realidade em que a população mais pobre não tem acesso aos livros de literatura, a solução proposta não é investir em políticas públicas que visem a mudança dessa realidade e sim realizar a cobrança de impostos que, como resultado tornará ainda mais difícil adquirir esses objetos. Nega-se, escancaradamente, um direito que já se faz negado por diferentes vias.
Cabe aqui uma discussão, essencial desde sempre, mas que pouco se fala fora do ambiente acadêmico em torno da Literatura como Direito Humano. Quem fomentou esse tópico foi Antonio Candido, que é uma das figuras principais dentro dos estudos literários, em seu texto Direitos Humanos e Literatura, que trata de um debate apresentado por ele em uma de suas palestras datada de 1988 e que posteriormente foi incluído na coletânea Vários Escritos.
O debate em torno dos direitos humanos é campo para estudiosos de diversas áreas e de diferentes níveis. Para A.Candido (2011, p. 174) pensar em direitos humanos pressupõe:
“reconhecer que aquilo que consideramos indispensável para nós é também indispensável para o próximo. Esta me parece a essência do problema, inclusive no plano estritamente individual, pois é necessário um grande esforço de educação e auto-educação a fim de reconhecermos sinceramente este postulado. Na verdade, a tendência mais funda é achar que os nossos direitos são mais urgentes que os do próximo.” (CANDIDO, 2011, p.174)
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