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Roberto Forti de Souza

Pensão alimentícia, prisão e alimento

Fazer a compra do mês e levar para a mesa de casa os alimentos adquiridos no mercado é uma realidade de muitos, mas não de todos.


Segundo pesquisa da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN), cerca de 116,8 milhões de brasileiros encontram-se em situação de insegurança alimentar, enquanto, destes 116,8, em torno de 19 milhões não têm o que colocar na mesa para se alimentar. [1] Ainda no que se refere à alimentação, o pagamento da pensão alimentícia não foi suspenso por conta do agravamento da pandemia do COVID-19, afinal, a pandemia não tirou a fome de ninguém. [2]


Ainda que seja rotineiro o ato de dirigir-se ao supermercado para adquirir alimentos, muitas pessoas dependem do dinheiro de pensão alimentícia para subsistência e, em determinados casos, o “alimento” deverá ser buscado através do Poder Judiciário. A pensão alimentícia, como é popularmente chamada, é o meio pelo qual uma pessoa paga a outra uma quantia em dinheiro a título de alimento. Contudo, não é qualquer pessoa que pode cobrar da outra essa obrigação. Rotineiramente, o Pai, genitor, alimentante, que paga alimentos ao seu filho, alimentado.

Contudo, não necessariamente a pensão será cobrada apenas do pai pelo filho. O dispositivo legal 1.694, do Código Civil (Lei nº 10.406/2002), que versa sobre as partes legitimadas para exigir alimentos, diz o seguinte: “podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação”.


Assim, em determinados casos, filhos pagarão pensão aos pais, por exemplo. O que muito se vê, é o pai ou a mãe que paga alimentos ao filho, no entanto esta segunda hipótese é menos comum. Os meios judiciais para a cobrança dos alimentos são as ações de alimentos, seja para sua fixação ou reajuste (para mais ou para menos) ou por meio da execução de alimentos.


O processo de execução é um procedimento que o exequente (autor) busca a realização de um direito certo, determinado, um título judicial ou extrajudicial. [3]. A execução é um procedimento mais rápido, não há discussão se o executado (réu) é devedor ou não, apenas que ele deve pagar sob pena de juros, multa e, no caso do devedor de alimentos pode incorrer a prisão civil.


Já no processo de conhecimento, ocorrerá a citação do réu para que apresente contestação, oitiva das partes[4], tentativa de conciliação, enfim, um processo por completo. No final, haverá uma sentença fixando os alimentos ou modificando o valor, por exemplo. Quando não há o pagamento das pensões que estão em atraso, o alimentado - aquele que recebe alimentos - poderá ingressar com processo de execução, caso possua título executivo e com isso, o executado deverá pagar o que deve. A execução de alimentos se processa em dois ritos, o da penhora de bens e o da prisão.


A penhora de bens ocorre quando o devedor não arca com suas obrigações, devendo o credor valer-se de outros meios para receber aquilo que tem direito, ou seja, penhorar bens do executado a fim de que seu patrimônio responda pelas dívidas, garantindo ao credor a possibilidade de receber seu crédito.


No ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição Federal, norma suprema que regula as demais leis, não permite a prisão do devedor civil, ou seja, obrigações que se encontram no âmbito civil[5] não podem provocar a prisão do devedor. Sem embargo, a Constituição permite a prisão civil do devedor de alimentos como legítima, sendo a única hipótese de prisão civil legal.


A Constituição Federal aborda, em seu artigo 5º, inciso LXVII, traz a seguinte redação: “não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel''. No entanto, hoje, não é permitido a prisão do depositário infiel. Dessarte, já decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF), que não haveria prisão civil, mesmo com a permissão constitucional, salvo ao devedor de alimentos. O fundamento jurídico-normativo trazido pela Suprema Corte foi o Pacto de São José da Costa Rica, que veda a prisão do depositário infiel.[6] Esse pacto é um tratado internacional, o qual o Brasil é signatário e, quando vem a integrar o ordenamento jurídico brasileiro, tem força de norma constitucional.


Contudo, por se tratar de uma questão alimentar e da subsistência de uma pessoa, a prisão civil ocorre apenas como medida para forçar o devedor ao pagamento, ou seja, se efetuado o pagamento que está em atraso a prisão não pode ser decretada. A prisão civil não é medida punitiva, o devedor não é punido pelo fato de não pagar, mas serve como uma forma de compelir o mesmo ao pagamento da obrigação alimentar, pois se pagar o que deve, não será preso.


No entendimento de Bertoldo Mateus de Oliveira Filho, em seu livro, “a doutrina de muito firmou o entendimento de que em tal acepção devemos considerar não só os alimentos necessários para o sustento, mas também os demais meios indispensáveis para as necessidades da vida, no contexto social de cada um”[7]. Desse modo, a pensão alimentícia é muito mais do que um simples pagamento a título de alimentos, trata-se de prover a sobrevivência de outrem, na ordem educacional, médica, alimentar, sendo mais severa a lei para coagir o devedor ao seu pagamento.



[1] Disponível em: https://pesquisassan.net.br/

[2] A 3ª turma de julgamento do Superior Tribunal de Justiça decidiu, por conta da pandemia causada pelo novo coronavírus, suspender as prisões civis do devedor de alimentos.

[3] Título executivo judicial: sentença, provimento judicial; título executivo extrajudicial: documento que comprove direito de uma das partes sobre algo. Ex: contrato com assinatura de duas testemunhas é um título executável.

[4] Oitiva das partes: é o testemunho, o relato das partes (autor e réu) para o juiz entender o que está se passando na relação processual.

[5] O direito civil regula o direito das pessoas. A palavra civil vem de civilização, cidadão. É o direito rotineiro que regulam as relações interpessoais.

[6] Depositário infiel é a pessoa que se recusa a devolver bem alheio que foi confiado em depósito.

[7] Alimentos e Investigação de Paternidade, BH, Ed. Del Rey – 1993.





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