Antes de responder a essa pergunta é importante entendermos do que se trata a pirataria e também que conheçamos o retrato atual do acesso à cultura, mas principalmente, a filmes e séries, no Brasil.
O que é Pirataria?
Pirataria, ou pirataria moderna, é o termo utilizado para se referir à prática de vender ou distribuir produtos sem a autorização dos proprietários da marca ou produto. Atualmente, é possível encontrar uma variedade de produtos piratas, de itens de vestuário, como roupas e sapatos, até softwares de computadores. A pirataria é considerada crime contra o direito autoral, e a pena para este delito pode chegar a quatro anos de reclusão e multa. Porém o artigo 184 Código Penal e a Lei 9609/98 estabeleceram a pirataria como crime de ação penal privada, ou seja, aquela que não é movida automaticamente mas sim quando a vítima pede a condenação do suspeito.
Durante a pandemia de Covid 19, que no primeiro semestre de 2020 já afetava a maioria dos países e que levou grande parte da população mundial a cumprir isolamento social em suas residências, o consumo de produtos audiovisuais teve um salto e o consumo por vias ilegais acompanhou esse crescimento. Uma pesquisa guiada pela Business Bureau e apresentada no Streaming Brasil 2021, mostrou que nos últimos quatro meses de 2019, só na América Latina, 27.274.181 domicílios com internet consumiram pirataria online. E nos últimos quatro meses de 2020, esse número subiu para 28.042.837. Um aumento de quase 1 milhão. Já especificamente no Brasil, 33,5% dos domicílios com internet consumiram pirataria online no quadrimestre final de 2020. Entre os gêneros mais pirateados, estão filmes e séries (17,72%), esportes (14,96%) e canais premium (12,16%).
A realidade do acesso ao audiovisual no Brasil
O censo realizado pelo IBGE no ano de 2018 constatou que 39,9% das pessoas moravam em municípios sem, ao menos, um cinema. A pesquisa ainda aponta dados preocupantes em relação as pessoas afetadas pela escassez de acesso a cultura, que varia por sexo, cor ou raça, grupo de idade e de nível de instrução. Em relação aos grupos de idade, a pesquisa mostra que crianças e adolescentes são a faixa etária mais afetada: sendo que 43,8% das pessoas com até 14 anos vivem em municípios sem cinema, e pessoas sem o ensino fundamental completo têm menos acesso a cinemas e provedores de internet do que pessoas com maior nível de escolaridade.
Durante a pandemia, apenas 64% das pessoas pertencentes às classes D (famílias com rendimentos acima de dois a quatro salários mínimos) e E (composta por rendimentos mensais de no máximo dois salários mínimos) tinham acesso a provedores de internet, sendo que cerca de 90% se conectam à rede apenas pelo celular. Essa realidade diminui ainda mais a possibilidade dessa parcela da população consumir filmes e séries em plataformas streaming, por exemplo.
E mesmo diante desse cenário desigual, em Outubro de 2021 a Assembléia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou um projeto de lei do deputado Arthur do Val, que visava acabar com o benefício da meia-entrada de jovens em eventos culturais e esportivos no estado de São Paulo. O projeto claramente distorce a ideia da meia-entrada e amplia ainda mais os abismos sociais, intensificados pela pandemia. Apesar de ter seguido para ser sancionado, felizmente o projeto de lei foi vetado pelo governador de São Paulo.
Pirataria x Direitos Autorais
A preocupação quanto aos direitos autorais é sempre usada como principal argumento contra a pirataria de produtos audiovisuais, já que diante de uma distribuição ilegal, os autores não recebem os royalties [1] da venda de suas obras. Porém, a pessoa física (o autor da obra) é bem menos afetado do que uma corporação (que produz e distribui a obra), por exemplo. O primeiro, se refere a um sujeito que vive (no Brasil, com muitas dificuldades) de sua capacidade criativa, o segundo se refere a empresas, ou conglomerados de empresas, quase sempre de grandes proporções, que lucram direta ou indiretamente com a exploração das obras audiovisuais. Confundir o sujeito do autor com as corporações e grandes estúdios, ao utilizar a expressão “direito autoral”, escondem-se os verdadeiros interesses econômicos atrás da “luta” pelo “pobre autor que está sendo roubado”.
Conclusão? Bom senso e consciência!
Segundo o que está previsto na lei e dentro do consenso geral, não devemos consumir qualquer tipo de produto pirata. Porém, como vimos anteriormente, o acesso, não só a filmes, mas à cultura em geral, no Brasil continua concentrado em regiões desenvolvidas e entre classes sociais privilegiadas, sendo assim, não está disponível a todas as pessoas. Por isso é importante entender que cada caso é um caso, e usar nosso bom senso e consciência para tomar as decisões certas acerca desse assunto. Mas você aí, que tem acesso a salas de cinema, internet e, consequentemente, ao diverso leque das plataformas streaming, não tem desculpa pra ficar consumindo produtos piratas, hein?
[1] Royalties são uma quantia paga por alguém a um proprietário pelo direito de uso, exploração e comercialização de um bem. O royalty pode ser pago para o governo ou para a iniciativa privada. https://www.suno.com.br/artigos/royalties/
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