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Marina Schuwarten

Aborto e as eleições presidenciais de 2022

Com as eleições presidenciais deste ano, o tema do aborto esteve em voga principalmente no segundo turno, no qual houve trocas de acusações entre os candidatos Jair Bolsonaro e Luiz nácio Lula da Silva em um cenário que ambos se posicionaram publicamente contra.


Jair Bolsonaro e aliados com a bandeira contra aborto e drogas. Imagem: Reprodução/Twitter.


Ao verificar as falas dos presidenciáveis em suas respectivas campanhas, nota-se que o debate sobre aborto no Brasil é extremamente raso, resumindo toda a problemática em ser “a favor ou contra”, o que não se mostra adequado.

Primeiramente, é importante salientar que o aborto é um evento comum na vida reprodutiva das brasileiras e, ao contrário do que o senso comum sugere, a Pesquisa Nacional do Aborto (PNA) realizada em 2010 e 2016 pelo Instituto Anis de Bioética aponta que a maioria das mulheres que realizam o procedimento são religiosas, já tem filhos e estão na fase adulta. Não subsiste, portanto, o argumento de que quem defende a legalização do aborto é “contra a vida”, já que trata-se de direitos sexuais e reprodutivos de uma pessoa com capacidade de gestar e a possibilidade de exercê-los de forma integral, e assim, decidir sobre seus corpos e projetos de vida.

Outrossim, é necessário expor como o Presidente da República, pode influenciar na ampliação ou restrição do direito ao aborto. O chefe do poder executivo não tem autoridade de modificar diretamente a legislação sobre a interrupção da gravidez, vez que qualquer proposta de mudança deve passar pelo Congresso ou pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Portanto, o presidente eleito poderia tentar exercer sua influência para que os parlamentares votassem a favor de sua proposta. No âmbito do STF, há ações como a ADPF 442[1] que ainda estão em trâmite, porém não estão perto de serem finalizadas. Em 2023, dois Ministros irão se aposentar e o presidente será capaz de indicar novos juristas para o cargo, que terão abertura para se posicionar de qualquer forma sobre o tema. Ressalta-se que essas indicações necessariamente precisarão ser aprovadas pela maioria do Senado.

Entretanto, pela maneira que a discussão foi levada durante o período eleitoral, é pouco provável que haja qualquer intervenção para que a legislação que sobre aborto seja mais permissiva ou restritiva. Sem contar que, conforme exposto anteriormente, a mudança teria que passar pelos parlamentares, que em sua maioria, são conservadores. Dessa forma, qualquer tentativa do presidente eleito de tentar priorizar essa pauta, seria encarada de forma negativa.

A verdade é que pouco se falou sobre aborto nessas eleições, em parte porque o assunto é considerado “tabu” e tal polêmica causaria perda de eleitorado. Até mesmo no campo progressista, enfrenta-se a dificuldade de colocar a pauta em voga e, quando é mencionada, limitam-se a dizer o óbvio: que é uma questão de saúde pública. E como não poderia? A PNA indica que uma em cada 5 brasileiras já terá feito pelo menos um aborto durante a vida até completar 40 anos.

Com a falta de aprofundação do debate, a sociedade perde como um todo, no entanto as mulheres (principalmente as mais pobres) são as mais prejudicadas, porque mesmo que o aborto seja uma prática milenar, é rodeado de estigmatização e preconceito que são frutos da criminalização e do avanço do conservadorismo. Sabe-se que a tipificação penal da prática não impede que ela ocorra, apenas dificulta que seja feito de forma legal, segura e gratuita. Assim, o aborto não deve ser tratado como “moeda de troca” e ser evitado, mas e sim evidenciado, para que seja desmistificado e encarado como direito de escolha reprodutiva daquela pessoa que gesta.


Mulher exibe cartaz sobre a realidade do aborto no Brasil. Imagem: Reprodução/Rede Brasil Atual

Mulheres protestam pela legalização do aborto no Brasil. Imagem: Tomaz Silva/ Agência Brasil


Notas

[1] Arguição de descumprimento de preceito fundamental é uma ação processual que visa proteger os termos da Constituição Federal, evitando ou reparando violações aos preceitos fundamentais originários de atos do poder público.


Referências bibliográficas


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