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Amanda Marcondes

As Tropes no Cinema: o que são e qual sua influência?



Imaginação: uma fonte (não tão) infinita


Os filmes, assim como outras diversas formas de expressão artística, permitem que um indivíduo use toda sua criatividade e imaginação para contar uma história através da utilização de sons e imagens. Porém, a imaginação pode ser um elemento difícil de controlar; quem nunca ouvir falar do famoso "bloqueio criativo"? Esse tipo de bloqueio, muito comum entre escritores, é capaz de estagnar produções artísticas por meses e até mesmo anos, e isso acontece quando indivíduos não conseguem se sentir inspirados para dar continuidade a ou concluir uma obra.


Se levarmos isso em consideração, podemos compreender porque acabamos encontrando em produções artísticas, mas principalmente cinematográficas, elementos narrativos repetidos.


Clichê, Arquétipos e Tropes


Inicialmente, a primeira palavra que nos pode vir à mente para definir a recorrência de elementos narrativos semelhantes é o clichê. “Clichê” pode ser descrito como uma fórmula ou ideia pronta que, por ser muito repetida, acaba perdendo a credibilidade e, portanto, acaba sendo vista como algo negativo.


“Arquétipo” é um termo que vem da Antiguidade. Na concepção de Platão, era um termo que poderia ser usado para designar as ideias que são os modelos originários de todas as coisas existentes. Mas, já no âmbito cinematográfico, os arquétipos têm mais semelhanças com os conceitos apresentados pelo psicanalista suíço Carl Jung, que os definia como “um conjunto de ideias originadas da repetição progressiva de uma mesma experiência durante muitas gerações, armazenadas no inconsciente coletivo” (1980, p. 25-26). O psicanalista chegou a dividi-los em 12 (que ficaram conhecidos como os “Arquétipos de Jung”) e dizia que todos nós possuímos vários arquétipos que estão presentes na construção de nossa personalidade, mas que a tendência é que sempre exista um dominante.


Já as Tropes (ou Tropo, como foi comumente traduzida do inglês) também podem ser definidas como personagens ou tipos de narrativa nas quais as principais características são sempre as mesmas e/ou se repetem. Porém, no caso das tropes, essa repetição não é necessariamente vista como um defeito ou como algo negativo. Muitas tropes, na verdade, costumam ter, em sua origem, várias influências externas e, consequentemente, também acabam se tornando influências de comportamento, cultura pop, até mesmo a ponto de moldar a visão que a sociedade em geral têm e/ou pode ter sobre um assunto.







Tropes e as lentes hollywoodianas do cinema


Talvez até hoje você nunca tenha ouvido falar desse termo, mas você com certeza já assistiu algum filme ou série que utilizava de tropes ou arquétipos narrativos. Mas, caso você ainda duvide, vamos fazer um teste rápido.


Quero que você pense em um filme em que o personagem principal, que até então vivia uma vida totalmente comum, acaba se envolvendo em uma situação inusitada que o convida para uma jornada fantástica, a qual de início ele se recusa a aceitar. No decorrer dessa história, o protagonista também encontrará um mentor, aliados, e é claro, inimigos. Passará por desafios que o tornarão mais forte e, por fim, uma grande provação que colocará em prova tudo o que ele aprendeu até ali. Apesar de difícil, ele sairá dessa provação vitorioso e levando para casa uma recompensa por seus feitos.


E aí? Aposto que pelo menos 5 filmes lhe vieram à mente, e a explicação é simples: o que foi descrito anteriormente é um breve resumo da famosa Jornada do Herói, criada pelo escritor Joseph Campbell e que é um recurso narrativo utilizado até hoje em diversas histórias, sejam as contadas em livros ou em filmes. As tropes funcionam da mesma maneira, porém, conseguem ser ainda mais específicas, podendo se tornar muito populares durante um período e depois caírem em desuso.


Como exemplo, podemos citar a trope da "Cool Girl" (Garota Descolada), que foi um hit durante os anos 2000, e que consistia em personagens femininas que eram vistas como descoladas porque possuíam qualidades vistas como “majoritariamente” masculinas, como gostar de comer muito, beber cerveja, assistir esportes e jogar videogame. Porém, a “Cool Girl” era um título reservado apenas para personagens que atendiam a um padrão de beleza: em sua maioria branca, magra (sem fazer qualquer exercício ou dieta) e atraente (mas sem se preocupar com roupas e maquiagem).


Aliás, se existe algo que as Cool Girls não suportam ou ao que são claramente opostas é a feminilidade, ou o que é considerado, majoritariamente, feminino. Seja gostar de fazer compras, usar maquiagem ou mostrar mais sensibilidade e vulnerabilidade. A Cool Girl pode ser vista facilmente vista nas personagens: Mikaela, de “Transformers” (interpretada por Megan Fox), Mary, de “Quem Vai Ficar com Mary?” (interpretada por Cameron Diaz), Andie, em “Como Perder Um Homem em 10 Dias” (interpretada por Kate Hudson) e Natasha/Viúva Negra, nos filmes de heróis da Marvel (interpretada por Scarlett Johansson). É bem óbvio para quem quiser ver que a Cool Girl não é nem um pouco inspirada em mulheres reais, mas sim numa fantasia masculina presente na mente de homens que escreveram essas personagens.


Ao conversar com pessoas, mas principalmente com mulheres que assistiram a muitos desses filmes em que as Cool Girls eram vistas como personagens almejadas pelo público feminino, percebi que muitas vezes meninas acabavam por emular alguns dos comportamentos para serem vistas e até mesmo aceitas dentro de ambientes compostos majoritariamente por meninos. Apesar dessas meninas terem interesse genuínos por esportes, videogames e revistas em quadrinhos, só seriam aceitas nesses ambientes era possível se atendessem a dois requisitos: serem atraentes, e deixarem de fora as características femininas que não são agradáveis aos olhos dos homens.

Um consumo menos vazio


A Cool Girl é só um dos muitos exemplos de como uma trope narrativa pode influenciar a perspectiva de quem assiste um conteúdo. A Femme Fatale, O Nice Guy, A Manic Pixie Dream Girl, O Bad Boy, A Madrasta… são algumas tropes populares que já estão em nosso imaginário há tanto tempo que nem mesmo sabemos bem de onde vieram, mas que sempre conseguimos associar com certos personagens e comportamentos. Vale lembrar que essas tropes foram criadas e perpetuadas, em sua maioria, senão totalmente, por obras hollywoodianas.


Isso quer dizer que devemos parar de consumir todo e qualquer conteúdo que venha de lá? Claro que não! O fato principal é que nem sempre paramos para pensar em como filmes e séries e, de certa forma, todo tipo de conteúdo que consumimos atualmente na internet, é capaz de nos influenciar mesmo que minimamente em nosso comportamento, em como nos vestimos e até em como pensamos e vemos o outro. E é por isso que é tão importante enxergarmos e analisarmos o que estamos consumindo (de onde vem, qual seu contexto, o que quer nos dizer) de maneira mais crítica ou pelo menos consciente.



Bibliografia consultada


MARTINS, Dana. O que são Tropes? Conversacult, [s. l.], 10 mar. 2017. CCescrita. Disponível em: http://www.conversacult.com.br/2017/03/o-que-sao-tropes.html?m=1.


ANAZ, Sílvio Antonio Luiz. Teoria dos arquétipos e construção de personagens em filmes e séries. Significação: revista de cultura audiovisual, São Paulo, v. 47, n. 54, p. 251-270, 2020.



RAYNSFORD, Ar (org.). Os arquétipos de Jung: comentários de Ken Wilber. [S. l.]: [s. n.], [2016]. Disponível em: http://www.ariraynsford.com.br/uploads/2/7/3/5/2735270/arqu%C3%A9tipos_de_jung_-_comentarios_de_ken_wilber.pdf.


THE COOL girl explained. Direção: Debra Minoff e Susanah McCullough. Narração: Alani Waters. Produção e criação: The Take. [S. l.]: The Take, c2022. Disponível em: https://the-take.com/watch/the-cool-girl-trope-explained.


JUNG, Carl G. Archetypes of the collective unconscious. In: MCGUIRE, William (ed.). The collected works of C. G. Jung. 2. ed. Princeton press: Princeton, 1980. v. 9, parte 1, cap. 1. Disponível em: https://pt.b-ok.lat/book/2631050/8e673c.

Acesso em: 15 ago. 2022.



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