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Dafne Mordente Sotiropoulos

"Lady Bird: A Hora de Voar” e o Desenvolvimento do Adolescente

*Este artigo foi selecionado na 1ª Chamada Aberta*


CENA DO FILME – PROTAGONISTA ASSINANDO COMO “LADY BIRD”

Fonte: Universal Pictures


Lançado em 2017, o filme “Lady Bird: A Hora de Voar” retrata a vida cotidiana de uma adolescente que está terminando o colégio. Indicado e vencedor de importantes premiações do cinema, a trama foi dirigida e roteirizada pela estadunidense Greta Celeste Gerwig. Nascida em 04 de agosto de 1983, na cidade de Sacramento (Califórnia, Estados Unidos), é filha da enfermeira Christine Gerwig e do consultor financeiro e programador Gordon Gerwig. Interessada pelo mundo das artes desde cedo, após se formar em uma escola católica, iniciou o curso de Inglês e Filosofia na Universidade de Columbia, tentando, em seguida, ingressar em programas de mestrado relacionados à dramaturgia. Embora tenha sido rejeitada, insistiu no sonho e conseguiu seu primeiro papel em 2006 no longa-metragem “LOL”. Desde então, atua como atriz e cineasta, sendo reconhecida mundialmente, colecionando prêmios e ovacionada por diversas críticas.

Misturando ficção com vivências pessoais de Celeste, “Lady Bird: a Hora de Voar” (2017), com duração de 84 minutos, busca retratar a adolescência. A história de Christine McPherson representa tanto o período final da vida escolar, quanto o sonho da personagem de fazer faculdade em outro estado. Interpretada pela atriz Saoirse Ronan, a jovem enfrenta dilemas internos e externos, que envolvem paixões, amizades, família, estudo, trabalho, religião, estilo, escolhas pessoais e sexualidade. Durante essa fase de desenvolvimento, a protagonista se intitulou “Lady Bird”, negando seu nome de nascença e escolhendo por si própria a maneira que queria ser chamada. Assim, já no começo, é demonstrada a vontade da protagonista em ter sua própria liberdade. Estudante de um colégio cristão em Sacramento, deseja ser universitária longe de casa, em uma cidade grande, seguindo este plano até realizá-lo. A trajetória é marcada por contínuas brigas com sua mãe, que negava a vontade da filha e repreendia suas atitudes rebeldes. Além disso, a garota enfrenta outros impasses nos relacionamentos, como desilusões amorosas, brigas e reconciliações com amigos, além de questões financeiras e estudantis. A narrativa mostra detalhes pequenos e realistas sobre o amadurecimento, colocando em pauta tanto a “hora de voar”, quanto as permanências e marcas do crescimento.

A complexa obra pode ser uma ferramenta de análise e compreensão dos adolescentes. Utilizando a teoria contemporânea nomeada de “Síndrome Normal da Adolescência”, do psiquiatra argentino Maurício Knobel, é possível perceber uma série de elementos presentes nos personagens. No livro “Adolescência Normal” (1981), do médico com a profissional Arminda Aberastury, são descritos relevantes fatores, sendo eles: procura de si e da identidade; tendência grupal; necessidade de fantasiar e intelectualizar; impasses religiosos; deslocamento temporal; evolução sexual; atitude reivindicatória; contradições contínuas; separação gradual dos pais; mudanças de humor e estado de ânimo. Todos os itens aparecem na filmagem.

Christine McPherson está num contínuo caminho de encontrar a sua identidade. Isso é perceptível, por exemplo, quando decide a forma que quer ser chamada, com quem se relaciona, que roupas deseja vestir, as músicas que gosta de escutar e até mesmo na escolha de atuar. Já as tendências grupais são notadas nas situações em que ela interage com diferentes ciclos sociais, como na sua amizade com Jenna Walton (Odeya Rush), que anda com pessoas ricas e populares, ou na sua relação com Kyle Scheible (Timothée Chalamet), uma figura mais alternativa em seus modos de pensar e agir. Afastando-se e aproximando-se deles, encontrou tanto interesses comuns, quanto a não identificação. Seus conflitos religiosos também são contemplados na obra. Ainda que estude em uma escola católica, ela nega pregações cristãs e as contesta, até mesmo publicamente na palestra de uma pedagoga contra o aborto. No entanto, no final, vai a uma missa. Ademais, Lady Bird exemplifica o deslocamento temporal, visto nas horas em que assume não ter tempo para avaliações, mas para se divertir sim.


CENA DO FILME – PROTAGONISTA E SUA MELHOR AMIGA CONVERSANDO

Fonte: Universal Pictures


A evolução sexual é abordada em vários momentos. Há o retrato das preocupações corpóreas das garotas, porque seus corpos estão mudando em razão da puberdade. Diálogos sobre masturbação e sexo. A perda da virgindade e a expectativa sobre esse momento. E a exploração da sexualidade, como na descoberta de Danny O’Neill (Lucas Hedes) em relação a sua homossexualidade. Ademais, as necessidades de fantasiar, intelectualizar e as atitudes reivindicatórias são apresentadas nesses jovens, principalmente, através de Kyle Scheible. O garoto fantasia, estuda e luta contra o sistema, acreditando em manipulações governamentais e criticando fortemente o capitalismo, sonhando em se afastar completamente do consumismo. Apesar de muito jovem, é fumante habitual, e, num dado momento, sustenta que apenas faz uso de cigarros de palha, porque não alimenta a produção de industrializados. Ou que os aparelhos celulares são na verdade mecanismos governamentais para vigiar e controlar a população.

Por fim, os últimos três fatores são apontados, em maioria, no vínculo da protagonista com a mãe. Ambas discutem muito, uma vez que Christine passa por intensas alterações de humor, ânimo e contradições. A progenitora tem dificuldades em conviver, lidar e entender essa fase, além de negar o crescimento da filha e os seus desejos e vontades, não querendo, por exemplo, que faça uma universidade em outro estado. Embora passem por conturbações, aos poucos vão enxergando e compreendendo uma à outra, algo que é desenvolvido no passar de toda a história e se conclui ao final. O crescimento, então, transparece a vinda do amadurecimento que, unido ao amor, superam barreiras e fortalecem relações.


CENA DO FILME – MÃE E FILHA DEITADAS

Fonte: Universal Pictures


Diante de todas essas colocações, a obra cinematográfica contribui ativamente para uma compreensão do final da adolescência e todo o desenvolvimento psicológico que a fase carrega. A dramaturga não poupou esforços para expressar de maneira realista e cuidadosa esse estágio da vida. Marcante e fundamental, ele sensibiliza questões afetivas, fisiológicas, sociais, sexuais, culturais e morais. Portanto, “Lady Bird: a Hora de Voar” (2017) é uma ótima opção para os amantes de cinema e para todos que querem entender melhor os adolescentes.


Referências Bibliográficas:

KNOBEL, M. Síndrome da adolescência normal. In: ABERASTURY, A. & KNOBEL, M. Adolescência normal. 9ª ed. Porto Alegre, Artes Médicas, 1981.

LUISA, Ingrid. Lady Bird é uma história sobre voar e permanecer. Super Interessante, 2018. Disponível em: <https://super.abril.com.br/blog/turma-do-fundao/lady-bird-e-uma-historia-sobre-voar-e-permanecer/amp/>. Acesso em 08/12/2021.

OUTEIRAL, José. Adolescer – Estudos revisados sobre a adolescência. Rio de Janeiro: Revinter, 2003.

P.S.M.O., Ana Clara. Mulheres no cinema: Greta Gerwig. Instituto de Cinema SP. Disponível em: <https://institutodecinema.com.br/mais/conteudo/mulheres-no-cinema-greta-gerwig>. Acesso em 08/12/2021.


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