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Amanda Marcondes

O Cinema Indígena: Demarcando seu Espaço no Audiovisual Brasileiro

Atualizado: 3 de out. de 2021

De acordo com dados fornecidos pelo IBGE, disponíveis no portal da FUNAI[1], no último censo cerca de 896 mil pessoas se declararam indígenas, sendo os povos Tikuna, Guarani Kaiowá, Terena, Kaingang e Makuxi considerados os cinco mais populosos do país. Talvez seja difícil imaginar que o povo indígena, hoje representando menos de 0,5% da população brasileira, já chegou a aproximadamente 5 milhões de habitantes no território nacional antes da invasão dos portugueses em 1500. O genocídio indígena, presente até os dias de hoje, também acontece através da tentativa de apagamento de sua história e de sua cultura na arte.


Das telas da tevê....


As primeiras representações aconteceram através das telenovelas com destaque para as que foram exibidas pela maior produtora nacional de ficção televisiva, a Rede Globo. Das 665 novelas produzidas entre os anos de 1963 e 2016, apenas 28 delas traziam personagens indígenas em suas tramas. Dentre elas é possível observar:


  • Uga Uga (2000): Comédia que conta a história de um jovem branco e suas dificuldades em retornar à civilização depois de ter sido criado por uma aldeia indígena quando seus pais, pesquisadores que lideravam uma expedição na floresta amazônica, foram mortos pelos mesmos.


  • Alma Gêmea (2005): Ambientada inicialmente em 1920, conta a história do amor eterno de Rafael e Luna, um casal separado de maneira trágica e que, cerca de 20 anos depois, voltam a se encontrar quando Luna reencarna no corpo da indígena Serena.


  • Araguaia (2011): O drama do protagonista Solano tem origem em uma maldição indígena lançada sobre a sua família, em 1845. O antigo feitiço condena à morte, à beira do Rio Araguaia, todos os homens de sua linhagem em razão de um romance proibido que havia acontecido entre a avó de Solano e o indígena Apoena.


Por muito tempo as produções audiovisuais brasileiras retrataram o povo indigena de forma esteriotipada e generalizada, através das lentes coloniais, sem considerar a diversidade das 300 etnias existentes no país ou de seus aspectos culturais, como as 274 diferentes línguas faladas. A representação distante da realidade também pode ser observada nas tramas ao considerarmos que, em sua grande maioria, os personagens indígenas nem mesmo são interpretados por pessoas indígenas.



...para as telas do cinema!


A história do cinema indígena pode ser dividida em dois momentos principais desde seu início do século XX, um primeiro período onde a temática era abordada apenas por cineastas não-indígenas; e um segundo período, onde os filmes são produzidos por cineastas indígenas. Mas somente nos últimos anos houve um crescimento de produções que tratam da temática indígena, não apenas dentro da ficção, como também em filmes documentais, trazendo a realidade atual desses povos e sua constante luta pelo direito de existir. Isso já pode ser observado em produções como:


  • A Febre (2019): o filme trata da integração do indígena na sociedade, bem como da sua liberdade de retornar às origens na floresta e continuar vivendo segundo as tradições ancestrais, num contato direto com a natureza. O longa recebeu seis indicações no festival Locarno[2], em que, inclusive, o ator indígena Regis Myrupu recebeu o Leopardo de Ouro de melhor ator.


  • Martírio (2016): esse documentário faz uma análise da violência sofrida pelo grupo Guarani Kaiowá, uma das maiores populações indígenas do Brasil nos dias de hoje, localizada no centro-oeste brasileiro, que está em constante conflito com as forças de repressão e opressão organizadas pelos latifundiários, pecuaristas e fazendeiros locais, que desejam exterminar os indígenas e tomar as terras para si.


  • Amazônia Sociedade Anônima (2019): o ducumentário acompanha o movimento dos indígenas e ribeirinhos, em uma união inédita liderada pelo Cacique Juarez Saw Munduruku, enfrentando máfias de roubo de terras e desmatamento ilegal diante do fracasso do governo brasileiro em proteger a Amazônia.


Em todo o mundo, vem sendo incentivada a iniciação de alguns povos indígenas na arte e na indústria do cinema, principalmente por meio do ensino-aprendizagem de técnicas de manipulação de câmeras, direção, atuação, elaboração de roteiros e edição de vídeos. A “Vídeo na Aldeia” é um exemplo dessas iniciativas. O projeto, criado em 1986, trabalha na formação de cineastas indígenas e na produção e divulgação de seus filmes, apoiando suas lutas e contribuindo para a garantia de seus direitos culturais e territoriais. Ao longo dessa trajetória, o projeto construiu um dos mais importantes arquivos audiovisuais sobre a realidade indígena atual, reunindo cerca de 8 mil horas de imagens produzidas junto a mais de quarenta povos no Brasil.


A formação e o espaço que vem sendo conquistado pelo crescimento do cinema indígena e a construção de sua identidade proporciona a representatividade tão necessária e dá voz a temas, narrativas, personagens, atores e atrizes acerca das problemáticas indígenas contemporâneas.



[1] FUNAI é a Fundação Nacional do Índio, o órgão indigenista oficial do Estado brasileiro, criado em 5 de dezembro de 1967. Disponível em: http://www.funai.gov.br/index.php/a-funai


[2] Nome de um Festival de Cinema Internacional que acontece na cidade de Locarno (Suíça), onde os prestigiados concorrem à estatueta do Leopardo de Ouro. Disponivel em: https://www.locarnofestival.ch/LFF/home.html


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


NUNES, Karliane Macedo et al. Cinema Indígena: de objeto a sujeito da produção cinematográfica no Brasil. Polis: Revista Latinoamericana, ano 2014, ed. 38, 15 jul. 2014. Disponível em: http://journals.openedition.org/polis/10086. Acesso em: 9 jul. 2021.


MARTINS, Rui. A Febre: filme brasileiro de temática indígena, é apresentado em Locarno. Observatório da Imprensa, [S. l.], ano 2019, n. 1050, 13 ago. 2019. Disponível em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/cinema/a-febre-filme-brasileiro-de-tematica-indigena-e-apresentado-em-locarno/. Acesso em: 11 jul. 2021


NEVES, Ivânia; CARVALHO, Vivian. A presença indígena na telenovela brasileira: poder, interdição e visibilidade. Intercom: Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, 2019. Disponível em: https://www.scielo.br/j/interc/a/SPB8R8ncV7qjPnxTTc6XFcd/?lang=pt Acesso em: 16 jul. 2021.


VÍDEO Nas Aldeias. Disponível em: http://videonasaldeias.org.br/loja/sobre/ Acesso em: 9 jul. 2021.


O BRASIL Indígena (IBGE): Folder Brasil Indígena. FUNAI, 2020. Disponível em: http://www.funai.gov.br/index.php/indios-no-brasil/o-brasil-indigena-ibge. Acesso em: 10 jul. 2021.


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