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Laura Lopes

O papel da série Pose na retomada de atenção dos jovens LGBTQIA+ para IST’s na atualidade

Atualizado: 3 de out. de 2021


Personagem Angel

O impacto da série estadunidense Pose (2018, dir. Ryan Murphy) transcende qualquer expectativa. Habituada em Nova Iorque, sobretudo na cena underground oitentista da cultura dos ballrooms – evento originário da comunidade LGBT+ afro e latinoamericana, marginalizada, que se reunia em casas noturnas para desfilar e celebrar naquele espaço as diversas formas de expressão e performance de gênero e sexualidade – a trama explora diversos temas ligados à existência LGBT+ racializada de forma autêntica. Isso, inclusive, se dá pelo fato da equipe de roteiro, produção e elenco ser predominantemente parte dessa comunidade (Pose é a série de televisão com maior número de pessoas transexuais no elenco da história).


Além do teor político, Pose ilustra, principalmente, o universo cultural criado inicialmente como válvula de escape da realidade hostil, que posteriormente torna-se uma forte expressão de identidade. A série é repleta de redes de apoio entre os personagens, que se acolhem como irmãos. Ao longo dos episódios são formadas Casas, famílias que competem como equipes nos desfiles. A protagonista, Blanca, constitui uma das principais casas da série: a casa Evangelista.

Blanca, mulher latinoamericana e transexual, após ser diagnosticada com HIV, decide abrigar outros membros desamparados da comunidade para ajudá-los a encontrar seu lugar no mundo. Simultaneamente, o vírus da AIDS se alastra pelos Estados Unidos e acaba atingindo a população LGBT+ que, até então, não possuía recursos suficientes para lidar com a doença.[1]


Atualmente, embora haja políticas públicas favoráveis à proteção e cuidados da população LGBT+, por exemplo, no Brasil, é o caso do Programa Brasil Sem Homofobia e a Política Nacional de Saúde Integral da população LGBT[2], os entraves encontrados na área da saúde ainda representam uma ameaça à prosperidade da comunidade: falta de estudos, dados e conhecimento em geral a respeito de doenças que (e como) afetam lésbicas e mulheres bissexuais; ausência de campanhas frequentes que chamem a atenção dos jovens para IST’S (infecções sexualmente transmissíveis); discriminação recorrente nos ambientes clínicos, principalmente contra cidadãos transexuais.


Todavia, Pose é um importante exemplo de produção audiovisual, (dentre as literárias e artísticas) que assume o papel de conscientizadora em um cenário que falta de informações. Durante toda a trama, entramos em contato com pessoas portadoras de HIV – vírus que ataca o sistema imunológico e pode desenvolver a AIDS, transmitido via oral, sexual e através de seringas e outros objetos contaminados – e observamos de perto os impactos na saúde e também em suas vidas pessoais.


É necessário considerar que a série acontece entre as décadas de 80 e 90, época em que os medicamentos utilizados eram rudimentares e em que se sabia muito pouco sobre o vírus, porém, o que perdura até hoje é o fato de que o HIV atua de diversas formas em cada indivíduo. Os personagens soropositivos, isto é, portadores do vírus são retratados de maneiras diferentes, de forma a mostrar que existem pessoas que vivem normalmente com o vírus e outras que desenvolvem a doença e se tornam extremamente vulneráveis rapidamente.


Essa é uma visão importante para a quebra de estigmas acerca dos indivíduos soropositivos, que, além de conviver diariamente com o vírus, acabam convivendo com o preconceito. A série não hesita em retratar os conflitos pessoais de quem tem o vírus e passa a ter seus relacionamentos afetados pela desinformação.


Personagens Blanca e Pray Tell, ambos portadores de HIV na série. Pray Tell é interpretado pelo ator Billy Porter, soropositivo na vida real.

Pose inclui a questão das IST’s (mais especificamente, a AIDS) em sua história com muita sabedoria e sensibilidade, e atua como conteúdo precioso para os jovens LGBT’s+ atuais, tanto para que tenham contato com o passado difícil que a comunidade enfrentou nas mãos do vírus HIV, como para retomar a atenção e o cuidado*, visto que, apesar de medicamentos mais sofisticados e queda nas taxas de mortalidade, esse vírus e outras doenças continuam circulando hoje, como a sífilis, hepatites A e B, HPV, entre outras.


*Tenho relatos de amigos e colegas que, após assistir a série, decidiram ir até postos de saúde próximos para fazer os testes de rotina.


[1] O vírus HIV, causador da AIDS (do inglês, Acquired Immunodeficiency Syndrome - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) emergiu e se alastrou em meados da década de 80; no início, a doença foi avassaladora na comunidade LGBT devido à marginalização e pouco acesso à informação e, portanto, ao uso de camisinha, que era a principal forma de prevenção. A ignorância, o preconceito e o conservadorismo passaram a divulgar a AIDS como “a peste” ou “o câncer” gay, um castigo. Na época, não haviam muitos estudos ou tratamentos eficientes para a doença, que matou milhares de indivíduos homo, bi e heterossexuais.

[2] Saúde LGBT - Os desafios encontrados pela comunidade LGBT no acesso à saúde no Brasil - Giovanna Gonçalves Vilaça da Cunha: https://revistapratodagent.wixsite.com/pratodagente/post/sa%C3%BAde-lgbt-os-desafios-encontrados-pela-comunidade-lgbt-no-acesso-%C3%A0-sa%C3%BAde-no-brasil



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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