**Sobre o autor: Roberto é Advogado, tem 24 anos e mora em Piracicaba. No âmbito profissional atua no contencioso cível, empresarial e direito das famílias e sucessões. Tem interesses por filmes de drama e suspense e é apaixonado pelo direito processual cível.
O casamento é um ato solene que possui uma série de requisitos para acontecer. Além disso, seu procedimento deve ser respeitado para que se torne válido e produza os efeitos esperados. Ele consiste, basicamente, na declaração da livre vontade de duas partes que desejam se casar perante autoridade pública competente.
É sempre importante relembrarmos que a declaração da vontade, melhor dizendo, falar o “sim”, não é algo visto apenas em filmes, decorre de força normativa, ou seja, a lei exige que os nubentes[1] declarem realmente que querem se casar e, assim, dizê-lo. No estado de São Paulo, a autoridade pública competente para celebrar o casamento é o juiz de paz[2], contudo pode variar de acordo com cada região.
A celebração do casamento é pública, o que significa dizer que será feita frente à toda sociedade civil, prevendo a lei de que a solenidade acontecerá “a portas abertas”[3]. Afinal, os efeitos do casamento repercutem não apenas sobre as partes, mas também sobre terceiros.
Um desses efeitos, que irá impactar a vida dos recém-casados, está relacionado ao patrimônio na forma dos regimes de bens, sendo este o tema do artigo. Em razão disso, é necessário entender o que é o regime de bens e quais são suas espécies. Porém, devemos entender antes o porquê disso ser tão importante no casamento, já que o casal pode possuir bens anteriores ao casamento e estes podem ou não vir a compor o patrimônio do casal, além dos que forem adquiridos durante a constância do casamento. Assim, o que irá definir isso é o regime de bens.
No Brasil há cinco regimes de bens, sendo eles: comunhão parcial de bens, comunhão universal de bens, participação final nos aquestos, separação legal ou obrigatória de bens, e separação convencional de bens ou total.
Iniciando pelo mais conhecido e também pela regra geral, temos o regime de comunhão parcial - o mais comum. Ele decorre de uma imposição legal quando as partes não desejam escolher qualquer outro regime.
Para que não seja realizado o casamento com o regime da comunhão parcial de bens, é necessário realizar o pacto antenupcial. No Brasil, o pacto antenupcial apenas definirá o regime de bens que o casal escolher adotar e precisa ser feito por escritura pública para que seja válido. Em outros países, pode-se decidir outras questões relacionadas à união, como, por exemplo, prever multas em caso de traição por parte de um dos cônjuges.
Todavia, caso seja escolhido o regime supletivo (comunhão parcial), não há necessidade que seja realizado o pacto antenupcial. Ao casar-se, o regime que constará na certidão de casamento será o da comunhão parcial. Este por sua vez, prevê que todos os bens que sobrevierem ao casal na constância do casamento irão se comunicar, ou seja, serão patrimônio de ambos[4], assim sendo definido como patrimônio de ambos. Um ponto importante: nem todos os bens que sobrevierem ao casamento serão do casal. O artigo 1.659 do Código Civil traz algumas situações em que eles não irão se comunicar, podemos citar como exemplo bens recebidos por sucessão[5] e bens anteriores à data do casamento.
Outro regime presente no nosso ordenamento jurídico é o da comunhão universal de bens. Que, por sua vez, funciona da seguinte maneira: “Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte”. Simplificando, será do casal todo o patrimônio anterior ao casamento e o adquirido durante. Aqui, os bens recebidos por sucessão a um dos cônjuges se tornarão bens do casal, salvo se tiverem cláusula de incomunicabilidade[6].
Seguindo a ordem do Código Civil, o próximo regime é, talvez, menos conhecido, chamado regime de participação final nos aquestos. No entanto, deixaremos este por último, visto que ficará mais fácil de entendê-lo após a explicação do regime da separação de bens.
Existem dois regimes da separação de bens: o convencional e o legal. Quando tratamos desses dois últimos regimes, é necessário distingui-los, já que seus efeitos são diferentes.
O regime da separação convencional de bens ocorre quando os nubentes optam para tal regime, por isso o nome convencional, porque ambas as partes combinaram. Já o legal, decorre exclusivamente por força da lei, sendo imposto este regime aos nubentes quando: i) forem maiores de 70 anos; ii) dependerem de suprimento judicial para se casar (pessoa com 16 anos que quer casar, mas não tem autorização dos pais, podendo obter a autorização concedida por juiz de direito); e iii) daqueles que contraírem matrimônio sem observar as causas suspensivas (Art.1.523, CC), que podemos citar como exemplo, o divorciado que se casa sem antes ter sido decidida a partilha de bens do outro casamento, nesta celebração, adotará-se o regime da separação legal.
A separação de bens, seja convencional ou legal, faz com que os bens anteriores ao casamento e os que sobrevierem durante o casamento não se comuniquem. Isto é, cada cônjuge tem seu patrimônio pessoal. Interessante mencionarmos que a lei utiliza a palavra sobrevier e não adquirir, e aí está a principal diferença, já que ambas, legalmente, significam outra coisa. Nos regimes da separação, não irão se comunicar nenhum tipo de bens que sobrevierem ao casamento. Entretanto, no caso da separação legal, o Supremo Tribunal Federal, editou o enunciado da Súmula 377, que assim dispõe: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”, ou seja, os bens que foram adquiridos na constância do casamento de forma onerosa (com proventos - salário - do casal, seja de um ou ambos os cônjuges) se comunicarão para ambos, devendo ser divididos em caso de dissolução do matrimônio.
Retornando ao regime da separação final nos aquestos, este é um mix do regime da separação e da comunhão parcial, porque durante o casamento cada cônjuge tem patrimônio próprio (separação), mas quando há dissolução da sociedade conjugal, cabe a cada metade dos bens adquiridos pelo casal durante o casamento a título oneroso (comunhão parcial).
É muito importante ressaltarmos que as palavras utilizadas pela lei podem alterar toda a forma de entendimento sobre os regimes de casamento, ora quando são adquiridos de forma onerosa, ora quando se refere aos bens que sobrevierem ao casamento.
Toda essa questão também irá afetar a terceiros. Vejamos alguns exemplos a seguir.
Um pai que pretende deixar um imóvel para um filho sem que esse imóvel um dia possa ser do cônjuge, deve ser observado o regime de casamento entre o casal (filho e nora) e, feita essa análise, proceder a doação cumprindo com os requisitos para que a vontade do pai seja obedecida.
Outro exemplo é a execução de dívidas. Quando determinada dívida é contraída por certo cônjuge na constância do casamento, geralmente, é uma dívida do casal. No entanto, se o regime for o da separação, a dívida é daquele que a contraiu, não passando ao outro.
Em razão disso, recomenda-se que os nubentes estudem qual regime melhor se adequa às necessidades do casal. É possível, também, que o regime seja alterado posteriormente, mas o procedimento não é feito na esfera administrativa em cartório. Para isso, será necessário ajuizamento de ação junto ao poder judiciário e isto deve ser assinado por ambos os cônjuges, ou seja, ambos devem estar de acordo com a mudança.
Por fim, ressaltamos que não existem regimes de bens melhores que outros, mas é fundamental que os nubentes saibam quais são as consequências de cada um em uma possível dissolução. Por conta disso, sugere-se que o casamento se dê pela separação convencional, em que os patrimônios estão individualizados e, em caso de eventual dissolução, não haverá tanta litigiosidade, discussão quanto à distinção dos bens de cada um que é de quem ou quanto a cada cônjuge gastou de seus recursos para adquirir determinado bem.
[1] A palavra nubente vem da antiga Roma do “nubere”. Na época, as noivas cobriam os rostos com véus e estes eram transparentes como as nuvens. Durante os anos, a palavra foi ganhando novo significado e, hoje, o nubente é aquele que irá contrair matrimônio e que está apto para tal.
[2] Juiz de Paz é um juiz não concursado, mas que exerce funções específicas, como por exemplo, a celebração de casamentos.
[3] Art. 1.534 do Código Civil. “A solenidade realizar-se-á na sede do cartório, com toda publicidade, a portas abertas, presentes pelo menos duas testemunhas, parentes ou não dos contraentes, ou, querendo as partes e consentindo a autoridade celebrante, noutro edifício público ou particular.”
[4] Art. 1.658 do CC. “No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.”
[5] Sucessão no sentido de o herdeiro herdar os bens do morto.
[6] Cláusula de incomunicabilidade: cláusula que prevê que determinado bem doado a pessoa não irá se comunicar com o cônjuge, isto é, o cônjuge não terá direito sobre aquele bem.
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