A autora recomenda ler o conto ouvindo a música abaixo:
Querido primeiro amor,
Você não sabe como isso é difícil para mim, mas sinto que a melhor coisa é te deixar. Ainda sinto a amargura do arrependimento fazendo a dor lacerante arrepiar meu corpo e destruir meu coração, por saber que preciso te deixar, mesmo havendo a oportunidade de optar por não fazer isso. Porém, eu tentei viver essa opção e não funcionou, não me senti mais viva como me sentia antes ao seu lado, me senti presa num redemoinho de pensamentos, inseguranças e expectativas – todas falsas –, mais do que tudo, me senti impotente, por saber e reconhecer que não posso fazer nada a respeito e, por mais que eu tente espernear e gritar aos sete ventos, não faz diferença, você já tomou sua decisão, a vida já aceitou outro rumo e eu, tentando remar contra a corrente, só continuo a enfraquecer meus braços e a respirar com mais angustia. Esse sentimento não é bom.
Esse sentimento não é bom como o sentimento que sentia antes com você. E para que você saiba como sou grata por ter te tido por um milissegundo em minha vida, vou te contar como me senti.
Com você aprendi a amar pela primeira vez na vida. Você foi meu primeiro amor e por isso sou grata e me sinto honrada, porque, de todas as pessoas, nunca imaginei que seria você, nunca imaginei que me sentiria assim e te agradeço por ter me dado a oportunidade de te amar e de te deixar me amar. Você chegou como o vento de primavera, ainda tímido com o inverno. Não sei o porquê, mas eu me lembro exatamente da primeira vez na minha vida em que soube da sua existência. Naquele então, e ao decorrer dos anos, não dei muita importância para o fato de me lembrar tão bem disso, mas você sabe como sou, gosto de acreditar...e, hoje, eu acredito que desde lá já havia um sinal – maktub – no sentido bom da expressão, obviamente.
Eu sempre te falei, você nunca acreditou. Então, em minhas últimas palavras, agora, espero que você acredite: você sempre foi magnético para mim – não sei se, em um primeiro momento, foi pelo seu jeito, mas, enfim. Depois da primeira vista, tenho dois momentos na memória: em um aniversário, eu devastada com amizades e devaneios da mente, consequência do primeiro ano de universidade, você vinha conversar bastante comigo ao longo da festa, em uma hora pediu para deitar-se no meu colo, bem coisa de adolescentes da série Malhação. Em outro momento, eu novamente angustiada com o encerramento de um ciclo, você chegou até mim, perguntou se estava bem, ouviu o que tinha a dizer e sentou-se comigo no banquinho até o nervosismo passar. O tempo passou, não te vi mais, mas num infeliz aniversário, em que eu fiquei a maior parte do dia dormindo para esquecer da vida, você foi uma das poucas pessoas que me mandou parabéns. Eu lembro bem desse dia e te agradeço pelas palavras de comemoração.
Eu vivi, ou melhor, aprendi a viver. E você também, você me contou diversas coisas que aconteceram na sua história, umas tristes, outras felizes e tudo te levou ao momento em que te vi novamente naquele 12 de março. Naquela noite, quando te ouvi contar as coisas da sua vida, as mudanças que tinha feito e senti os sonhos que você tinha, fiquei mais do que feliz em saber de você e da sua vida. Naquela noite, eu não esperava que o beijo acontecesse, mas aconteceu. O coração até mesmo dispara lembrando daquele momento.
Enfim, começamos a nossa história e dela você já sabe. Mas queria te contar o que talvez você não saiba sobre ela. Primeiramente, queria te dizer que a segurança que senti e ainda sinto, de certa forma, com sua presença, mesmo longe, traz um enorme reconforto. Nunca sequer duvidei de você e te agradeço pela nobreza para comigo ao longo desse nosso relacionamento. Também, queria te dizer que nunca me senti tão amada, eu sabia que tinha o seu abraço para me refugiar e suas caricias para transformar meu estômago em mil borboletas. Por você tive motivos para querer conversar com alguém o tempo todo e para quebrar meu casulo de anos – que, brutalmente, me ensinou a ser sozinha –, pela primeira vez na vida eu quis compartilhar todos os meus dias com alguém, sem medo de qualquer rejeição.
Eu me lembro de todos os momentos que vivemos juntos, das noites quentes de verão sentados conversando, dos açaís tomados, das estrelas brilhando e, principalmente, de Orion olhando para nós. Curiosamente, me lembro de todas as roupas que usei e colares que combinei para dar um destaque ao look. Me lembro das pessoas que você sempre conhecia e cumprimentava em todo lugar, sem exceções. Me lembro de todos os carinhos e brincadeiras de entrelaçar os dedos das mãos e todos os abraços quando te via. Me lembro das histórias que você contava e como eu pensava em cada coisa que você se metia e, finalmente, vencida por quão abismada me sentia, ria. Me lembro das andadas noturnas no carro e das músicas que eu tocava no seu celular. As voltas para casa sempre eram difíceis, era sempre uma mistura de impotência e tristeza por ter que te deixar, mas, assim que deitava em minha cama, as mensagens com declarações de amor me traziam a esperança e ansiedade boa para te ver de novo. Ainda passo pelos lugares onde você estacionava o carro na tentativa de fazer o tempo correr menos depressa, antes de me deixar em casa, lugares em que, no silêncio das madrugadas, parecíamos ser apenas nós dois no mundo. Me lembro de todas as vezes em que você disse me amar, lembro de todas as vezes em que você foi descongelando meu coração aos poucos, me ensinando a dizer “Te amo”.
Você é meu primeiro amor, por isso, nunca vou te esquecer e sempre serei grata de ter sido você. Foram várias as vezes em que me imaginei vivendo uma vida inteira com você, casados, com filhos e idosos, mas, como te disse um dia, em meu coração, nosso romance de verão – e aqui não utilizo essa expressão para diminuir a magnitude de nosso romance – já pareceu durar uma vida inteira para mim. Depois da primeira vez que você foi, fiquei sem chão. Ouça “Desalento” e saberá como me imaginava suplicando para seu melhor amigo para saber como você estava. Da primeira vez que voltei e sabia que iria te reencontrar onde tudo começou, tive esperança.
Aos poucos, fui me permitindo viver, mas ainda sinto que não consegui me permitir plenamente e isso me machuca. Saiba que durante esse tempo todo ainda penso e amo você e ainda continuarei amando por um tempo, até as cicatrizes se curarem totalmente. Se eu pudesse, quero que você saiba, eu moveria montanhas e atravessaria mares para a gente dar certo, mas você já tomou sua decisão. Ela me dói, mas você já a tomou. Então, decidi que é momento de parar de tentar, porque, enfim, meus braços não têm mais tanta força e cada vez respiro com mais angústia. Saiba que não tenho muito mais a te oferecer, mas ainda tenho uma imensa procura e uma violenta esperança, espero que você reconheça esse trecho da Clarice Lispector, porém, diferentemente dela, não conseguirei esperar por anos até que você também tenha corpo-alma para me amar. Sei que ainda somo moços, você mesmo me falou, mas eu não aceito perder mais tempo algum da minha vida inteira. Pronto, te entrego, da forma mais vulnerável, minha resposta.
Mas, antes de ir – o que me parte o coração – tenho que te dizer que desejo uma maravilhosa vida a você e que sou eternamente grata por ter tido alguém de tanta relevância em minha vida que tenha sido tão bom comigo. Você é um ser muito puro, não deixe nunca ninguém te fazer duvidar do contrário. Assim me despeço de você, na esperança de que eu tenha sido tão boa para você, como você foi para mim.
Com muito amor, para meu primeiro amor,
Sarah.
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