Esse final de semana fui pra praia do Guarujá, fiquei na casa da minha tia, a mesma dos cenários da minha infância. Apesar disso, o momento que mais lembrei dessa época não foi guardado nas paredes da conhecida casa , mas no aberto da praia em si. Lá da areia, estirada na canga bege com detalhes em verde, eu ouvia de fundo as típicas ofertas:
– Queijinho na brasa, queijinho da brasa
– Aceita caipirinha moça?
– Quem vai querê tererê?!
Só um dos vendedores oferecia em silêncio; passava pela praia o carrinho do sorveteiro sem necessidade de forçar a garganta; as crianças, no mais profundo da distração e brincadeiras de se auto empanar na areia fofa ou destruir com incomparável agilidade castelos erguidos pelos pais, percebem com facilidade o passageiro herói.
Correm até ele com a pressa de demorar na escolha do picolé, analisam o panfleto e começam o inquérito:
– Esse é bom?
– Esse deixa a língua azul?
– Tem de brigadeiro? E de paçoca? E de caramelo?
– Esse de morango tem gosto de que?
“De morango” o sorveteiro responde com a mesma seriedade com a qual foi perguntado, ciente da responsabilidade que lhe foi dada.
Ele está diante, não apenas de Mariazinha, mas encara olho a olho uma infância inteira. É responsável pelo sabor que marca uma época, vai se misturar ao cenário da praia do Guarujá, ao cheiro de maresia de uma casa usada só aos finais de semana e ao frio da praia quando se sai do mar no fim da tarde, que só colo de mãe esquenta.
Ele sabe, e por isso responde com tal seriedade, ele sabe que a vida caminha e que a infância também chega ao fim da tarde e se põe sem festa, sem alarde e nem dia marcado, só carrega cheiro e gosto.
– Quero de milho verde! – A criança escolhe.
O sorveteiro dá, coloca o dinheiro no bolso e segue pela praia, passageiro, assim como a infância.
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